GREEN SAVERS
Investigadora portuguesa propõe novo método de valor acrescentado para tratamento de efluentes
A cana-de-açúcar pode ser
utilizada com eficácia e dupla vantagem em estações de tratamento de
águas residuais (ETAR) de plantas, substituindo as tradicionais
macrófitas, tais como o caniço. A cana-de-açúcar assim obtida pode ser
usada, por exemplo, para a produção de biocombustível. A conclusão
resulta de um trabalho de doutoramento em Ciências e Engenharia do
Ambiente, da Universidade de Aveiro (UA), e é mais um contributo para
encontrar alternativas sustentáveis e de valor acrescentado face aos
sistemas convencionais de tratamento de efluentes.
As ETAR de plantas, também conhecidas por leitos de macrófitas – que
são plantas adaptadas a solos alagados -, ou zonas húmidas construídas
para tratamento de efluentes, constituem uma alternativa ecológica e
sustentável aos sistemas convencionais de tratamento, particularmente
para o tratamento terciário de efluentes domésticos. Ou seja, para a
remoção de fósforo e azoto, embora existam sistemas deste tipo a
realizar tratamento de efluentes industriais, nomeadamente para remoção
de metais pesados. As ETAR de plantas são constituídas por leitos,
normalmente escavados no solo. Estes leitos são impermeabilizados e
preenchidos com materiais de enchimento, tais como diversos tipos de
argilas expandidas, e plantados com macrófitas.
O caniço (Phragmites australis) é uma das macrófitas mais
utilizadas, devido à sua grande capacidade de remoção de poluentes e
elevada resistência a condições ambientais extremas.
As argilas expandidas utilizadas no enchimento dos leitos são
normalmente produzidas para este fim e com especificações que asseguram
uma boa remoção de poluentes, particularmente fósforo. Estas argilas
podem ser substituídas por alguns resíduos e desperdícios que também
apresentam boas capacidades de adsorção de fósforo e representam uma
opção mais sustentável. É o caso dos desperdícios de tijolo e de telha
da construção civil e de diversas rochas e minerais industriais e
ornamentais.
Assim, “evita-se o consumo de matérias-primas e de energia na
produção de materiais específicos para o enchimento e soluciona-se a
questão da deposição dos desperdícios”, afirma Mafalda Vaz, estudante de
doutoramento em Ciências e Engenharia do Ambiente e autora do estudo
que teve como orientadoras Isabel Capela, professora do Departamento de
Ambiente e Ordenamento da UA, e Dina Mateus, professora do Instituto
Politécnico de Tomar.
Nos sistemas convencionais de tratamento, a remoção de fósforo
faz-se, normalmente, por precipitação química, através da adição de sais
de ferro e de alumínio, o que aumenta a quantidade de lamas produzidas e
dificulta e encarece o seu processamento. Nas ETAR de plantas, o
tratamento dos efluentes ocorre à medida que estes atravessam o leito e
mediante diversos processos físicos, químicos e biológicos, semelhantes
àqueles que ocorrem nas zonas húmidas naturais. A presença de macrófita,
normalmente caniço ou tabúa (Typha sp.), aumenta a eficácia destes sistemas de tratamento.
Cana-de-açúcar em substrato de desperdício é eficiente
“A ideia de utilização de cana-de-açúcar, em vez das plantas
macrófitas tradicionalmente utilizadas nestes sistemas, surgiu-me por
acaso quando fazia uma pesquisa sobre biocombustíveis e a questão da
ocupação de grandes áreas de terreno arável para a produção de culturas
energéticas era apontada, pela maior parte dos artigos que consultei,
como um constrangimento ao uso mais alargado destes combustíveis”,
explica Mafalda Vaz.
A necessidade de grandes áreas de terreno também tem sido uma
limitação ao desenvolvimento de ETAR de plantas, que precisam de maiores
dimensões dos que os sistemas tradicionais de tratamento para atingirem
igual eficácia. Então, “porque não juntar as duas funções e construir
uma ETAR de plantas energéticas?”, questionou-se a investigadora.
No estudo avaliaram-se as eficiências de ETAR de plantas à escala
piloto, com enchimentos de resíduos e desperdícios de tijolo e calcário,
plantadas com cana-de-açúcar. “Concluiu-se que estes sistemas, quando
correctamente operados e dimensionados são eficazes na remoção de
poluentes. A utilização de cana-de-açúcar, que é a grande inovação deste
trabalho, constitui uma mais-valia, pois trata-se de uma cultura
energética que poderá ser directamente convertida em bioetanol”, afirma a
doutoranda. “Penso que este estudo representa um contributo válido para
o desenvolvimento e incentivo à utilização desta tecnologia de
tratamento de efluentes”, conclui.
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