Autofagia: um mecanismo chave para um envelhecimento saudável?



A descoberta do mecanismo da autofagia, que arrecadou este ano o Prémio Nobel da Medicina, pode contribuir para uma melhor compreensão de patologias, como as vinculadas ao envelhecimento, e talvez um dia permitir que os humanos vivam mais tempo com boa saúde, de acordo com vários especialistas.
créditos: Pixabay
O japonês Yoshinori Ohsumi foi laureado esta segunda-feira com o Nobel da Medicina pela sua pesquisa da autofagia, um processo de limpeza e, principalmente, de "reciclagem" das células.
"Este processo é muito importante, porque se a célula não é capaz de se limpar, haverá uma acumulação de resíduos", explicou Isabelle Vergne, investigadora do CNRS (Centro Nacional de Pesquisas Científicas, em França), que trabalha com autofagia.
"Se este processo é completamente desregulado, pode levar a muitas patologias", acrescentou. É o caso de doenças neuro degenerativas como o Alzheimer ou o Parkinson, doenças infecciosas e diferentes tipos de cancro.
Mas outras patologias como a obesidade ou a diabetes, algumas doenças cardiovasculares ou intestinais, ou mesmo a artrose, também podem estar ligadas à autofagia.
"A maioria das grandes patologias estão ligadas a uma insuficiência ou a uma disfunção do processo autofágico", afirmou o professor Guido Kroemer, outro especialista francês que trabalha no Instituto Nacional de Saúde e Pesquisa Médica (Inserm), em França.
A autofagia, que vem do grego e significa "comer-se a si mesmo" é um processo conhecido desde os anos 1960. Ohsumi identificou os genes essenciais da autofagia nos anos 1990, ao fazer uma experiência com fermento e demonstrar que as nossas células utilizavam um mecanismo similar.
A descoberta gerou uma série de pesquisas, que até ao momento se limitaram a plantas e animais.
"Tentamos compreender porque é que este processo diminui com a idade e tentamos encontrar inovações capazes de ativá-lo para manter as nossas células em bom estado por mais tempo e poder viver uma vida melhor e mais longa" afirmou Ioannis Nezis, professor da Universidade de Warwick, no Reino Unido.
Na maioria das patologias, a autofagia deve ser estimulada, como nas doenças neuro degenerativas, para eliminar os aglomerados de proteínas que se acumulam nas células doentes.
A importância também para a artrose
O mesmo acontece para a diabetes, a aterosclerose ou as doenças infecciosas, quando se trata de estimular a resposta imunológica.
"É mais complexo no cancro", segundo o professor Kroemer, que detalhou que, segundo o caso, pode-se procurar "estimular ou, ao contrário, inibir" o processo autofágico.
Trabalhos com animais revelaram que os estimuladores da autofagia podiam melhorar a resposta anticancerígena, através da resposta imunológica. Por outro lado, alguns investigadores trabalharam para inibir a autofagia e assim "reduzir o stresse celular ligado à quimioterapia", disse.
Segundo Vergne, que trabalha com a micobactéria que origina a tuberculose, cada vez mais resistente aos antibióticos, a estimulação da autofagia permite controlar a infeção.
Uma estratégia que se emprega também em outra micobactéria, muito presente em pessoas com fibrose quística, muito difícil de tratar. "Acreditamos que se chegamos a aumentar a autofagia, poderíamos eliminá-la (...) pedindo ao organismo que a mate através da autofagia", explicou.
Outra patologia, a artrose, que afeta principalmente pessoas mais velhas, também está na primeira linha.
Segundo Claire Vinatier, investigadora do Inserm, estudos pré-clínicos realizados em ratos revelaram que a ativação da autofagia desacelera o aparecimento da artrose e melhora "os signos de mobilidade". No entanto, na opinião da investigadora, as experiências com humanos ainda estão distantes.
Entre as moléculas já testadas em ratos está a rapamicina, um medicamento utilizado em humanos para reduzir as hipóteses de rejeição em transplantes. Para evitar os efeitos secundários deste potente medicamento, ele é injetado diretamente na articulação. Além disso, consideram-se outras opções, como a proteína Klotho, presente no corpo humano.
Enquanto não começam os testes clínicos em humanos, algo que ainda poderá levar anos, já se pode estimular a autofagia com a alimentação, através do resveratrol, um antioxidante encontrado no vinho tinto, em algumas frutas e no chocolate.
Outra opção deste tipo seria a espermina, outra arma anti envelhecimento, presente no queijo roquefort, indicou Patrice Codogno, especialista do Inserm.

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