Certo dia, Timor caiu-lhe no colo. Ela deixou cair, primeiro sem saber bem como lhe pegar, mas rapidamente deu por si a agarrar o jovem país com as duas mãos, segurou-o com unhas e dentes e, nesse processo, não podia imaginar como o seu colo, por culpa de Timor, havia de ficar tão grande e tão acolhedor, capaz de albergar vários países, várias missões, variadíssimas histórias de vida.
Teresa Maia é a dona do colo onde caem, volta não vira, países, províncias, problemas para resolver. Fundadora de um colégio em Linda-a-Velha, a que chamou Segunda Casa, sempre procurou integrar na parte curricular a hoje denominada responsabilidade social. «No meu tempo, chamava-se a isso valores, princípios ... mas o nome que se dá não importa. O que sempre quis fazer foi que os alunos da escola tivessem a consciência do outro.»

Um dia, Teresa foi convidada a integrar, com outras escolas a nível nacional, um projeto de apoio a Timor. Como sempre na sua vida, quando se mete em alguma coisa é para ser a sério. Não gosta de meios termos, de meias tintas, de meios gestos. E, por isso, atirou-se de cabeça e envolveu toda a escola com a mesma energia. Professores, alunos, pais.
O projeto, esse tal que foi o primeiro a aterrar-lhe no colo, consistia em geminar duas escolas e enviar todo o tipo de material escolar para lá. Mas Teresa, a tal que não se fica em meios caminhos, pôs os alunos da sua escola a escreverem cartas aos alunos timorenses e angariou tantos livros para Timor que ultrapassou todas as expectativas: as suas, as dos que a rodeavam e até as expectativas do ministério. Parecia ter nascido para lhe caírem no colo projetos assim.
E foi então que, consciente dessa habilidade e dessa paixão, Teresa Maia resolveu, em 2003, fazer nascer uma associação de seu nome Estímulo.

Os protagonistas desta associação são, além da própria, os professores, os alunos e os pais que fazem parte da escola que dirige em Linda-a-Velha
: «Sempre cruzámos muito os projetos em que nos íamos envolvendo com a própria escola. Daí que, quer os alunos, quer os pais se sentissem sempre muito empenhados em cada nova missão da Estímulo.»
Em 2005, a Estímulo foi contactada pelo Ministério da Educação para dar vida a uma nova incumbência, dessa vez em São Tomé e Príncipe, Teresa arregaçou as mangas, com aquele sorriso enorme que quem a conhece sabe que tem. E logo começou a planear a viagem: «Não há nada como ir aos sítios, perceber as necessidades, ver com os nossos próprios olhos a realidade que estamos a trabalhar. Sentir o pulso. Por isso, pus-me a pedinchar: quem é que conhece alguém em São Tomé onde eu possa ficar? Quem é que ajuda na viagem? E lá fui.»
A proposta do ministério era criar uma rede de centros de recurso. Mas Teresa optou por, em cada distrito, fazer centros de arte. «Começámos a angariar materiais escolares e tivemos o apoio da Universidade Nova, que nos ofereceu material de oficina: berbequins, serras, ferramentas várias. E decidimos repetir o que tínhamos feito antes: em Timor, fizemos uma biblioteca em Baucau, mas pedimos que a organização ficasse a cargo da escola, por sabermos que as escolas são respeitadas e levadas a sério. Em São Tomé, foi igual. As oficinas seriam da comunidade, mas as escolas é que ficavam responsáveis.» Mais uma vez, foi um sucesso. De tal modo que a associação começou a sentir necessidade de se organizar.

«Em 2010, registámo-nos na plataforma da Comunidade Europeia para sermos uma organização de serviço de voluntariado europeu.» Mas continuou sempre na mesma linha: fazer projetos concretos de intervenção nas várias comunidades locais, não muito prolongados no tempo. Ou seja, o que se pretende é satisfazer uma necessidade específica numa altura específica.
Neste momento, a mulher que dá colo a comunidades necessitadas está a enviar 4 jovens para a ilha do Fogo para um projeto que visa reforçar a sociedade civil durante seis meses. Em São Tomé, há ainda uma missão a decorrer. Mas Portugal também cabe nos seus braços.
«Sempre tivemos acções mais pontuais em datas especiais como o Natal, por exemplo. No Natal passado, o nosso foco foram as mães adolescentes, não só com bens essenciais para elas e para os bebés, como com incentivo e ajuda para que elas continuem os estudos, para que prossigam com a sua vida.»
E em Novembro de 2011 a associação Estímulo lançou a Operação Mérito, que visa apoiar os jovens que queiram prosseguir os estudos, mas que, sem ajuda, vejam o sonho condenado: «Há muitos estudantes, alunos excelentes, que terminam o secundário e que gostariam de frequentar a universidade, mas que, por falta de condições socioeconómicas, veem-se obrigados a desistir. O que nós pretendemos é ser intermediários entre estes casos e a sociedade à nossa volta. Queremos diagnosticar os casos e arranjar soluções. Por vezes, é preciso livros; outras vezes, será necessário arranjar uma empresa que se disponibilize a oferecer as fotocópias ou um local para estudar ... enfim. Começámos este projeto em janeiro e o nosso objetivo é, em 4 anos, atingir os 18 distritos.»
Como os apoios financeiros estão cada vez mais escassos, dada a conjuntura atual, Teresa vai inventando ações para angariar fundos. A escola passou a alugar uma sala para festas de aniversário e workshops, e o dinheiro desse aluguer reverte para a Operação Mérito. Nesta luta por verbas parcas em tempo de crise, a presidente da Estímulo decidiu fazer um festival de música e outras artes em junho. «Os artistas serão voluntários e, uma vez mais, o dinheiro reverterá para esta causa, de permitir que bons alunos possam prosseguir com os seus estudos. Vai haver bandas de garagem, há uma escola de danças latino-americanas que já se ofereceu para vir dançar, vai haver estudantes de música que virão tocar ... E, mais uma vez, este cruzamento entre a escola e a Estímulo vai sensibilizando os jovens para os seus pares que não nasceram com as mesmas condições. A semente está lá, julgo que vai crescer pela vida fora.»
Teresa Maia tem 52 anos e é a 4ª filha de oito irmãos. Os pais, de classe média-baixa, incutiram a todos o sentido da partilha e do trabalho. Assim, aos 16 anos, Teresa continuou os estudos, mas trabalhava como auxiliar de educação numa escola. O seu primeiro curso foi de Educadora de Infância, seguiu-se a licenciatura em Gestão Escolar e o mestrado em Administração Educacional.
Neste momento, e porque nunca é tarde para continuar a aprender (apesar de todos os instrumentos que toca diariamente), Teresa Maia está a terminar o doutoramento em Sustentabilidade Social e Desenvolvimento.
Casada, mãe de dois filhos (a Inês com 24 anos e o Francisco com 22), foi também, num período da sua vida, mãe de acolhimento de 4 irmãos: «Foram mais de três anos de convivência. Eles vinham ao fim de semana e passavam um tempo de qualidade connosco. Tinham uma história de vida difícil, uma mãe que se tinha suicidado e um pai alcoólico. Depois, foram todos separados, adoptados por diferentes famílias, e sofri muito por nunca mais saber nada deles.»

O colo, sempre o colo. Dado aos irmãos mais novos na infância, aos filhos biológicos e aos «filhos» de fim de semana, aos alunos da sua escola, a Timor, a São Tomé, às mães adolescentes, aos estudantes carenciados. Teresa Maia tem um colo do tamanho do seu sorriso. E dá-o com a mesma facilidade com que sorri.

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