Uma cidade chamada Agustina

Sérgio Almeida

No dia em que celebra 88 anos, Agustina Bessa-Luís é a autora em destaque na terceira edição do Escritaria. Até domingo, Penafiel acolhe conferências, colóquios e exposições destinados a celebrar a obra da autora de "Os meninos de ouro".

As homenagens nunca foram um corpo estranho na longa e preenchida vida da única escritora portuguesa viva em relação à qual se aplica com toda a propriedade o epíteto de "genial".
Todavia, por mais extenso que seja o rol de prémios, tributos e condecorações já recebidos, poucos podem comparar-se, pela dimensão e abrangência, à celebração que decorre nos próximos três dias em Penafiel, no âmbito do Escritaria, o único festival literário que, contrariando a tendência tipicamente lusitana, homenageia autores vivos.

"O estudo, a partilha e a fruição" assumem-se, segundo a organização, como as linhas fundamentais de um encontro cuja juventude não impediu o lugar de destaque que já detém no panorama literário nacional.

Gravemente enferma há vários anos, Agustina Bessa-Luís não irá marcar presença no evento - será representada por familiares -, mas nem essa ausência belisca o impacto de uma celebração que, nas duas edições inaugurais, homenageou respectivamente Urbano Tavares Rodrigues e José Saramago.

Tal como aconteceu nos anos anteriores, a organização procurou recriar elementos e personagens alusivos à vasta obra literária em causa, procurando transpô-los para o quotidiano. Por isso, quem passear nos próximos três dias pelo centro penafidelense não deixará de tropeçar nas múltiplas referências a livros marcantes da sua bibliografia, como "A Sibila" ou "Fanny Owen".

Nas fachadas dos edifícios, nas montras das lojas ou nos jardins, multiplicar-se-ão as alusões a passagens célebres - como os inimitáveis aforismos - dos livros da escritora que confessou certo dia ter nascido adulta, mas que iria morrer criança.

Dessacralizar a escrita, levá-la até aos transeuntes, continua a ser a palavra de ordem destas iniciativas, que incluem ainda, além da multiplicidade de intervenções artísticas em espaço urbano, actuações ao ar livre a cargo do grupo O Andaime.
O programa contempla ainda oficinas artísticas com alunos do ensino básico local, que, já amanhã de manhã, vão analisar "Pequeno Alberto, o pensador", da autoria de Mónica Baldaque, filha da escritora.

A presença de figuras há muito ligadas ao universo literário da romancista é outro dos atractivos do Escritaria. A começar por Manoel de Oliveira, o cúmplice de longa data que adaptou para cinema obras como "Vale Abraão" e "O princípio da incerteza".

Também cineasta e igualmente influenciado pela escritora, João Botelho é outra presença confirmada em Penafiel, onde irá assistir à projecção de "A corte do norte", filme que realizou há dois anos com base no romance homónimo. A exibição da película, no domingo à noite, encerra o certame, cujo rol de convidados abrange ainda Mário Cláudio, Fernando Pinto do Amaral e Inês Pedrosa, todos eles membros do painel de conferências marcado para a tarde de amanhã no museu municipal.

Além da componente expositiva - são três as mostras patentes no centro da cidade, que, cada qual a seu modo, procuram fornecer um retrato amplo da sua vida e obra -, o Escritaria contempla visitas a locais marcantes do seu percurso: não só a sua terra-natal, no concelho de Amarante, mas também as quatro casas onde habitou ao longo dos anos.

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