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Gastão, o "Lobo" da Ribeira, salvou 15 vidas no Douro

CARLA SOFIA LUZ

Bigode grisalho, boné, o anel de ouro do F. C. Porto, deixado em herança pelo pai, e olhar alerta. Gastão, o "Lobo do Mar" que a Ribeira chama cada vez que alguém cai ao rio, perdeu a conta dos corpos que resgatou do Douro.

foto LEONEL DE CASTRO/GLOBAL IMAGENS
Gastão, o "Lobo" da Ribeira, salvou 15 vidas no Douro
Gastão, o "Lobo" da Ribeira

"Não faço pequena ideia", insiste hesitante, forçando a memória de 40 anos de salvamentos. "A respirar salvei 15 pessoas, talvez"... A maioria tirou sem vida. Enquanto tiver forças, Gastão recusa perder um corpo para o rio.

Sozinho ou com a ajuda de amigos, o "Lobo" que não vive um dia sequer afastado do rio faz os resgates no pequeno barco azul e branco. Pintou-o assim em honra de uma das suas paixões. São três: "Primeiro a família, depois o Douro e o FC Porto", confessa. Sempre que vê alguém em apuros ou caído nas águas, não hesita. "Estou logo pronto. Desamarro o Lobo do Mar para lá ir. Salvar é um dom que tenho comigo".

É que Gastão Celestino Teixeira nasceu há 59 anos com os olhos presos no rio, no número 10 da Rua dos Canastreiros numa família de 16 irmãos. A vida de casado ditou a partida para a Madalena, em Gaia. Os pais e as irmãs foram para a torre 1 no Bairro do Aleixo, que espera pela demolição. "Livrei-me de boa", suspira. Em Gaia, trabalhou como oleiro na Cerâmica de Valadares até 2009.

Os colegas, conhecedores dos seus salvamentos, diziam ao vê-lo passar: "Lá vai o Duque da Ribeira". No entanto, Gastão, pleno de admiração pelo homem que "não perdia um corpo para o rio", recusa a comparação a Deocleciano. "Não gosto que me chamem de Duque. Duque só houve um. Era um homem que conhecia todas as linhas do rio. Sabia sempre onde estavam os corpos. Ia buscá-los ao fundo com a fateixa", recorda Gastão, que chegou a auxiliá-lo no resgate de um corpo numa pedreira da Madalena. "Ele fazia uma coisa que impressionava. Punha o corpo em terra, limpava-lhe a testa e, estivesse como estivesse, beijava-o logo". Com o Duque, Gastão aprendeu a importância de não deixar a família sem um corpo para enterrar. "Só se não puder é que não o tiro da água".

Aprendeu a nadar com a "barriga nas linguetas" da Ribeira. E, antes de ter um barco só seu, roubava o do pai para pescar enguias. Fez os primeiros salvamentos com 17 anos, antes de ir para a tropa. E nunca mais parou.

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