EXPRESSO
CANNES 2010

A "cabra" que nunca dorme

Inspirado pela crise económica e pelo 'caso Madoff', Oliver Stone refaz visita corrosiva ao mundo da alta finança.

Francisco Ferreira, enviado a Cannes

"A ganância faz bem", dizia Gordon Gekko (Michael Douglas) no filme "Wall Street", realizado por Oliver Stone, em 1987. Sempre incómodo para o poder, sempre controverso nos seus pontos de vista, Stone voltou agora ao mundo da alta finança. Fez uma inesperada sequela do filme dos anos 80. Só que tudo mudou, entretanto. E o que Gordon Gekko, depois de sair da prisão, diz agora, é bem diferente: "A ganância legalizou-se..." Benvindos a "Wall Street: Money Never Sleeps".

Filme de guerra? Mas que guerra?


Stone não está para brincadeiras e não tardou a pôr o dedo na ferida: "Ao fazer este filme, quis demonstrar que aconteceu uma guerra no nosso país, na selva da alta finança de Nova Iorque, a cidade em que eu nasci."

Por isso, o cineasta decidiu ressuscitar Gordon Gekko (este Michael Douglas maduro está cada vez mais parecido com o seu pai Kirk). Para tal, era preciso encontrar um fio condutor. Ficamos a saber que Gekko passou oito anos na cadeia por fraude fiscal e branqueamento de dinheiro. O dinheiro que, para Gekko, "é uma 'cabra' que nunca dorme. Uma 'cabra' ciumenta."

Uma vez corrupto, corrupto até ao fim


Cumprida a pena, Gekko pouco sabe da Wall Street actual, que entretanto se sofisticou. Escreve um livro a pregar arrependimentos e boas causas. "A prisão fez-me bem e devia agradecer a quem para lá me mandou", diz ele. Mas a sua filha Winnie (Carey Mulligan), que o responsabiliza pela insanidade da mãe e pela morte do irmão, não quer vê-lo. Entretanto, Gekko encontra um aliado no namorado de Winnie, Jacob Moore (Shia LaBoeuf).

Jacob é um jovem corretor ambicioso. O prolongamento moderno do 'yuppie' que Gekko era nos anos 80. A acção do filme arranca em 2008. Wall Street está prestes a desabar e a lançar a crise económica que o mundo atravessa. No castelo de cartas que é Wall Street reina Bretton James (Josh Brolin), o 'mau da fita', claramente inspirado na figura de Bernard Madoff. Mas haverá só um 'mau da fita'?

Oportunismo?


O que mudou, radicalmente, entre os dois filmes não foi só a natureza e a perversidade do universo financeiro. Foi também o cinema de Oliver Stone. O "Wall Street" de 1987 era um filme de actores, liberal, metódico, na linha do cinema de um Alan J. Pakula. A ficção era uma farsa da realidade.

No novo "Wall Street: Money Never Sleeps", a câmara de Stone plana pelas personagens e pels situações sem mostrar grandes ideias de cinema. E podemos até perguntar: não será perverso da parte do realizador fazer um filme capitalista (para a Fox) para combater o capitalismo? Nada é a preto e branco aqui. É tudo cinzento...

Wall Street: Money Never Sleeps
de Oliver Stone
(Fora de Competição)

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