D. Januário critica "centralismo da Santa Sé" e diz que "Concílio Vaticano II ainda não foi cumprido"

por Agência Lusa

O bispo das Forças Armadas, D. Januário Torgal Ferreira, defendeu hoje que, “mais dia, menos dia, haverá um concílio” dentro da Igreja Católica e criticou “o centralismo da Santa Sé”.

Em declarações à Agência Lusa, D. Januário Torgal Ferreira reconheceu que “o Concílio Vaticano II ainda não foi cumprido”, reagindo assim à carta enviada aos bispos pelo teólogo suíço Hans Kung, pedindo a realização de um novo encontro magno da Igreja.

“Eu acho que, mais dia, menos dia, haverá um concílio. Eu estou com o Papa em comunhão, mas o que eu não gosto é do centralismo da Santa Sé”, afirmou o prelado português.

“Num grande número de coisas, nós não somos devidamente ouvidos. Sei que tudo isto é uma máquina muito pesada, é difícil porque geograficamente estamos distanciados, mas por isso mesmo é que Deus nosso Senhor confiou à Igreja esta grande missão”, afirmou.

“Andamos para ai a falar em sacrifício, em entrega aos outros, em pobreza, em tortura. As torturas normais da vida é que são os verdadeiros cilícios. Porque é que as pessoas inventam sacrifícios, invenções de auto-flagelação, que eu abomino francamente, quando aquilo que nos flagela é a responsabilidade da missão que nos foi entregue?”, questionou.

Segundo D. Januário, “o mundo” é que constitui a “missão da Igreja”, um sítio onde “há os paralíticos, os estropiados, as crianças violadas, o tráfico sexual, os gestores de determinadas estruturas bancárias a rirem-se de quem tem uma gamela para comer uma sopa quando eles têm uma gamela de ouro”.

“Isto é que devia não nos deixar dormir, não são agora os cânticos ao Papa que aí vem, as camisolas, os triunfalismos, ou a quase a loucura perante o campeonato do mundo de África do Sul”, argumentou.

Apesar de não ignorar que Hans Kung “tem o coração ferido porque foi posto à margem do ensino da Teologia”, o bispo das Forças Armadas considera que o académico suíço apontou para “o rei que vai nu” num artigo “muito bem pensado”.

“Só porque foi um homem que eventualmente cometeu alguns erros, não esteve em comunhão com o Papa em tudo, vou dizer que ele não tem razão?” - interrogou.

D. Januário Torgal Ferreira recusa também a ideia de que o teólogo seja um “louco”: “Para mim não há doidos, há seres humanos. Está ali um ser humano a dizer que isto está muito mau”.

“A responsabilidade que nós temos é grande e não devemos fugir a essa responsabilidade. Muita gente ‘tira o cavalinho’ da chuva, há muita gente que sente-se incomodada”, afirmou.

“Tenho muito medo das emoções, de se dizer vamos todos salvar a família, como dizem agora uns quantos, ou vamos todos salvar a juventude e que vem aí o fim do mundo”, sustentou.

D. Januário Torgal Ferreira recusou ainda a ideia de uma campanha contra a Igreja e o Papa a propósito dos crimes de pedofilia cometidos por membros da Igreja, ao mesmo tempo que rejeita que o “sistema pensante da Igreja” seja “pedofílico”, ou que “abafe a sexualidade”.

“Os padres que falharam, e da forma ignominiosa como o fizeram, não são estes que estão contra o Papa? Não julgo ninguém, mas está provado objetivamente e aceite pelo próprio réu. Não são campanhas, não são calúnias, é a pouca vergonha instalada em alguns setores”, defendeu.

Apesar dos “avanços”, que tem feito de uma “forma espantosa”, a Igreja tem dificuldade em “aceitar o pluralismo”, considerou o bispo.

“Não significa que quem crítica tenha razão, mas pelo menos [deve-se] ouvir essa pessoa, chamá-la, dialogar com ela, para todos conseguirmos compor a casa”, afirmou D. Januário, embora reconhecendo que Hans Kung possa ter sido “excessivo” nomeadamente na questão do celibato dos padres.

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